Sistema une satélites e dados terrestres para melhorar produção no campo
terça-feira, fevereiro 25, 2020
A fome é um problema para muitos países,
principalmente os africanos. A fim de erradicá-la, autoridades, ativistas e
pesquisadores buscam soluções nas mais diversas frentes.
Uma cientista dos Estados Unidos resolveu usar uma tecnologia criada
pela Nasa para ajudar nessa batalha. A pesquisadora e sua equipe têm analisado
dados coletados por satélites da agência espacial americana para monitorar a
produção alimentícia.
As
informações são combinadas com dados obtidos em terra e previsões
meteorológicas, o que permite refinar o monitoramento — é possível, por
exemplo, prever a produção de cada tipo de vegetal. O projeto tecnológico
monitora mais de 40 países, mas os responsáveis pretendem expandir os
territórios.
“Para
muitos países africanos, a segurança alimentar é a questão mais premente da
atualidade”, destaca Catherine Nakalembe, líder do projeto, chamado
Iniciativa Global de Monitoramento Agrícola do Grupo de Observações da Terra
(GEO). A também professora-assistente de pesquisa na Universidade de Maryland,
nos Estados Unidos, cresceu em Kampala, na Uganda, e conta com mais de 40
parceiros na GEO. “Nosso objetivo é ajudar os países a desenvolverem os
próprios sistemas de monitoramento agrícola e a usarem dados de satélite
gratuitos e de baixo custo para informar decisões de agricultura e segurança
alimentar”, resume.
O
trabalho de Nakalembe e sua equipe consiste no uso de dados da Nasa que mostram
onde e quais tipos de culturas alimentares estão crescendo, além de como elas
evoluem à medida que a estação (de cada alimento) avança. As informações dos
satélites são combinadas com os dados coletados nas fazendas. Ao compararem as
informações sobre rendimentos de safras anteriores, os analistas podem estimar
quanto alimento será produzido em uma estação. “Podemos até dizer o quão
saudáveis são essas culturas”, detalha a pesquisadora.
Os dados
também são combinados com previsões meteorológicas, o que permite emitir
alertas de possíveis problemas. “Ao acrescentar a previsão de tempo a essas
análises, podemos dizer quando e onde é provável que as culturas falhem, em
outras palavras, podemos saber se uma área com culturas já estressadas sofrerá
inundações, secas, doenças ou infestação de pragas”, explica Nakalembe.
Esse
aviso antecipado dá às entidades que respondem à insegurança alimentar mais
tempo para preparar e até mitigar completamente a escassez e a fome, destaca a
cientista. “Isso pode ajudar os países a se prepararem para a redução de
alimentos e a mobilizarem esforços humanitários, bem como a gerenciarem as
colheitas para ajudar a informar os mercados de commodities e evitar oscilações
drásticas nos preços dos alimentos nas regiões”, afirma.
Limitações
Nakalembe ressalta que treinar especialistas de cada nação para realizar
a análise é a melhor maneira de expandir o alcance do sistema de monitoramento.
Essa tarefa, porém, é extremamente difícil, principalmente devido à falta de
tecnologia em alguns países. “É um trabalho árduo, principalmente porque muitos
países não estão em posição de fazer os investimentos necessários. Portanto, o
apoio da Nasa e de outros grupos é fundamental para tornar esse trabalho ainda
mais amplo”, frisa. Apesar de dificultoso, o projeto tem rendido frutos, avalia
a cientista. “Por exemplo, tivemos recentemente uma invasão de gafanhotos na
África Oriental. Os relatórios regionais forneceram aos países informações
atualizadas sobre a extensão e o impacto desse fenômeno”, ilustra.
Adaptações
Júlio Esquerdo, pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária,
acredita que o sistema criado é bastante inteligente, já que utiliza
tecnologias existentes para alcançar ganhos maiores na área agrícola. “O
monitoramento de culturas durante o seu desenvolvimento é algo que tem sido
buscado por muitos especialistas. Na Embrapa, também fazemos esse tipo de
análise em parceria com outros órgãos, como o Inpe (Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais).
Todas
essas medidas buscam otimizar a produção dos alimentos, uma necessidade global
e que é ainda mais importante para países que produzem muito, como o Brasil”,
afirma. “Assim como os autores do projeto falam, essas ferramentas podem
contribuir bastante para o combate à fome, com o aumento da produção, e também
para a economia, ajudando a controlar o preço das commodities.”
Para o especialista brasileiro, o
uso de tecnologias poderá ajudar, principalmente, a diminuir os danos causados
pelas mudanças climáticas. “O aquecimento é uma preocupação recorrente, pois
pode gerar uma série de desequilíbrios. Com as imagens geradas por satélites, é
possível entender melhor essas mudanças e, com isso, gerar ações que diminuam
ou impeçam prejuízos na produção de alimentos”, explica.
A GEO realiza o monitoramento em 44 países,
cobrindo ao menos 11 épocas de cultivo a cada mês. O objetivo dos cientistas é
expandir ainda mais esse sistema, incorporando outros países nas análises.
“Estou trabalhando com agências agrícolas e meteorológicas em Uganda, Tanzânia,
Quênia, Ruanda, Mali, Etiópia, Burundi e Níger para treinar analistas regionais
e nacionais sobre como acessar e usar informações de satélite para o
monitoramento da agricultura”, conta a líder do projeto.
Os métodos tradicionais de monitoramento agrícola
têm como alvo safras globais, com mapeamento em larga escala. Funcionam bem em
países que são grande produtores, que têm fazendas e monoculturas, como os
Estados Unidos. Mas em locais em que predominam os pequenos cultivos, essas
técnicas e esses processos não foram desenvolvidos ou implementados. “Esse é um
dos nossos objetivos. Acreditamos que, ao introduzir desenvolvimentos
tecnológicos em conjunto com programas de capacitação e monitoramento de
culturas nesses pequenos territórios, ajudaremos muito, fortaleceremos as
melhores tomadas de decisão na agricultura e na segurança alimentar”, aposta
Nakalembe.
Fonte: Correio Braziliense
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