Frutos nativos geram renda para moradores da Chapada do Araripe, no interior do Ceará
segunda-feira, fevereiro 24, 2020
Além do popular pequi, uma
diversidade de frutos nasce vizinho à Floresta Nacional do Araripe. Esta
riqueza tem se tornado importante alternativa para a economia local.
Na beira da rodovia, catadores vendem maracujá peroba, pequi, leite da janaguba e outros produtos colhidos na Chapada do Araripe — Foto: Antonio Rodrigues/SVM |
Bacupari, maracujá-boi, cambuí, araçá, araticum, mangaba. Boa parte dos
brasileiros pode não ser muito familiarizada com estes nomes, mas, na Chapada
do Araripe, sul do Ceará, eles compõem o paladar da população. São frutos
nativos que, além de presentes no cotidiano para o consumo in natura, se
tornaram importante fonte de renda para as comunidades rurais.
Nesta época do ano, período da quadra invernosa, além do popular pequi,
muito consumido no Cariri cearense, outros frutos colorem a paisagem verde, vizinha
à Floresta Nacional do Araripe (Flona Araripe), nos territórios de Crato, Nova
Olinda, Jardim e Santana do Cariri, até próximo a divisa com o estado de
Pernambuco.
“Aqui dá tudo!”, enfatiza o entregador José Nilton de Lima, que sempre
conviveu com pequi, pitomba, macaúba, cambuí e o maracujá peroba. Morador da
comunidade de Guritiba, em Crato, sua relação com os frutos sempre foi apenas
para o consumo. “Chupar e jogar no mato. Às vezes, faz um suco”, conta.
Araçá é um dos frutos encontrados na região — Foto: Antonio Rodrigues/SVM |
A prima dele e vizinha, a agricultora Bernadete dos
Anjos, já consegue desenvolver outros produtos a partir do processamento da mangaba,
como sorvete, creme e suco. “É uma planta nativa e medicinal. O chá serve para
pressão alta”, acredita. A safra deste fruto começou em novembro e seguiu até
início de fevereiro.
A
facilidade de as plantas frutíferas crescerem na Chapada do Araripe se dá por
dois fatores: clima e profundidade do solo. “Como as raízes são maiores e
fortes, precisam de espaço para crescer e aqui é ideal”, explica o engenheiro
agrônomo José Araújo Marôpo.
Pequi nativo da Chapada do Araripe — Foto: Antonio Rodrigues/SVM |
As
margens da CE-292, que liga Crato a Nova Olinda, se tornaram uma verdadeira
feira livre, impulsionada, principalmente, pelo pequi. Mas nos últimos anos
outros produtos têm ganhado espaço, principalmente o bacupari, chamado pelos
moradores de maracujá peroba. Ele tem sua safra neste mês de fevereiro, que
dura entre 15 a 20 dias.
Vendido a R$ 3 o saco
com aproximadamente 20 unidades, o amarelo do bacupari se destaca de longe nas
barracas. De sabor mais doce que o maracujá convencional, normalmente é
consumido in natura ou como suco. Com ele, os catadores têm sobrevivido. “Além
de ser nativo, não tem agrotóxico”, exalta Aldisio Sebastião da Silva, do Sítio
Mané Coco, que há quatro anos vende na rodovia.
Opções
Pelas
mãos do agrônomo José Araújo Marôpo e da auxiliar administrativa Maria Tereza
Praxedes, o cambuí, que possui um sabor doce e ao mesmo tempo 'travoso’, tem se
popularizado no Cariri. Juntos, eles criaram uma linha de 25 produtos com o
fruto nativo, a partir de 2006. Da polpa, fizeram o vinho e, depois, a cachaça.
A partir da casca e sementes, surgiram geleia, doce, licor, vinagre, mousse,
bolo, cocada, entre outros.
José Araújo Marôpo desenvolveu produtos a partir do cambuí — Foto: Antonio Rodrigues/SVM |
O processo de fabricação do vinho é idêntico ao convencional de uva, mas com outros cuidados para não desencadear uma fermentação nociva. Após passar por testes, ser patenteado e conquistar o selo orgânico, o vinho de cambuí tem produção anual de 3 mil litros. “É isento de qualquer inseticida”, reforça Marôpo.
Além de estimular a
economia local, o vinho do cambuí é mais saudável que os convencionais. Segundo
o agrônomo, ele possui 235 mg/ml de taninos, polifenóis responsáveis pela
neutralização dos radicais livres. Este valor dez vezes maior que de uva.
Expansão
A
partir das experiências com as bebidas, Tereza sentiu um certo desperdício da
casca e do bagaço do cambuí. Disso, veio a ideia de produzir licor, geleia e
vinagre. Depois de alguns testes, ampliou a cadeia para picolé, sorvete,
cocada, trufa, doce e até uma massa triturada para fabricar pães. Tudo é
vendido em casa e nas feiras orgânicas de Crato.
Cambuí é base para produtos como geleia e até vinho — Foto: Antonio Rodrigues/SVM |
A partir da experiência com o cambuí, os dois perceberam as possibilidades de trabalhar outros frutos nativos, como o maracujá-boi, araticum e mangaba. Deles, surgiram cachaça, licor, doce, geleia. Tudo é comprado de catadores da Chapada do Araripe e isso acaba gerando renda para as famílias.
Para Marôpo, o
trabalho desenvolvido com os frutos nativos é uma forma de estimular os
produtores a gerar uma renda e melhorar o aproveitamento destas riquezas
naturais.
Com a renda, Tereza destaca que nos últimos
anos os moradores têm tido um novo olhar para a preservação da Chapada do
Araripe. “Ao invés de cortar as árvores, o pessoal está plantando, tendo mais
cuidado. Há 20 anos, a gente via as pessoas derrubarem muito. Hoje, estão
procurando mudas”, completa.
Fonte: Portal G1
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