O comércio internacional de alimentos é inseparável da segurança alimentar
segunda-feira, dezembro 07, 2020
O comércio mundial de alimentos manteve sua vitalidade durante a pandemia e reúne as condições para ser um dos motores da recuperação econômica global.
Os dados do primeiro semestre de 2020, segundo o Monitor de Segurança Alimentar das Américas do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), oferecem uma referência clara sobre a resiliência da produção agroalimentar, em um contexto de excepcional dificuldade.
Enquanto a queda da atividade devido à Covid-19 causou uma diminuição no comércio internacional de 21%, o impacto foi bem menor, de apenas 5%, no setor de alimentos, cuja circulação entre os países é decisiva para a segurança alimentar global.
Estes números mostram que o setor tem potencial para se recuperar da crise muito mais cedo do que outros, o que representa uma excelente oportunidade para os países das Américas, explicou a embaixadora da Costa Rica junto à Organização Mundial do Comércio (OMC), ex-ministra da Agricultura e Pecuária do país centro-americano e presidente do Comitê de Agricultura do órgão regulador do comércio mundial, Gloria Abraham, especialista com longa experiência em questões agrícolas e negociações comerciais internacionais.
Abraham participou do "Diálogo sobre política comercial e seu papel na segurança alimentar nas Américas" com o Diretor-Geral do IICA, Manuel Otero.
A conversa fez parte de uma série de diálogos de alto nível entre Otero e altos funcionários e especialistas internacionais em questões agroalimentares.
Nesse caso, o foco foi no que está acontecendo durante a pandemia e, muito especialmente, no cenário internacional que os países das Américas enfrentarão na pós-pandemia.
Abraham foi Ministra da Agricultura e Pecuária da Costa Rica entre 2010 e 2014 (a primeira mulher a ocupar o cargo), representante do IICA no México e também ocupou cargos de destaque no Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e no Banco Mundial, entre outras instituições internacionais.
A funcionária disse que hoje é impossível falar em segurança alimentar sem o fazer ao mesmo tempo em comércio internacional.
“Uma em cada seis pessoas no planeta”, disse ela, “se alimenta graças ao comércio agroalimentar. As condições dos países a esse respeito são muito diferentes: alguns são exportadores líquidos de alimentos e outros importadores líquidos. É fundamental estabelecer vínculos estáveis e transparentes entre eles”, considerou.
Cadeias de valor globais como uma oportunidade
De 1995, quando entrou em vigor o Acordo sobre Agricultura da OMC, até 2020, o comércio mundial de alimentos dobrou e hoje chega a 1,5 trilhão de dólares, explicou Abraham. Mas a importância comercial do setor é ainda maior se considerarmos que um terço das exportações agroalimentares são comercializadas em cadeias globais de valor.
“Nesses casos, os produtos cruzam as fronteiras duas vezes: saem dos países produtores como produtos primários, recebem valor agregado nos mercados externos e entram como produtos acabados ou insumos para a produção”, explicou Abraham, que considerou que “a grande oportunidade para os países latino-americanos é agregar valor, com base na inovação e no conhecimento, para incorporar outros elos nas cadeias globais de valor de nossos produtos”.
Nesse sentido, Otero destacou que na América Latina e no Caribe as políticas comerciais e agrícolas devem ser estabelecidas a longo prazo, considerando que são questões decisivas para o presente e o futuro da região.
“A participação de nossos países no comércio agroalimentar internacional não se baseia em excedentes. Não é que participem quando têm o suficiente e depois veem o que acontece. Por isso, medidas inteligentes devem ser adotadas”, afirmou o Diretor-Geral do IICA.
Otero destacou o complexo cenário geopolítico em que se dão as negociações internacionais do comércio agroalimentar, considerando o surgimento dos países emergentes, a nova dimensão da agricultura sustentável, a internalização da questão ambiental e o “arrepiante” número de 700 bilhões de dólares em várias formas de ajuda e subsídios que, segundo Abraham explicou, foram autorizados pela OMC.
“Embora nem todo esse valor seja utilizado, ele representa metade do total do comércio internacional de produtos agrícolas. Precisamos revisar essas questões para ver que contribuição cada país pode dar, porque as tarifas sobre produtos agrícolas são o dobro das tarifas consolidadas para produtos industriais. E isso pode gerar distorções ao comércio. Precisamos reduzir as tarifas para tornar a circulação internacional de alimentos mais fluida”, disse o representante da Costa Rica na OMC.
Manuel Otero destacou a importância de que, em termos de comércio, a região deixe de olhar para fora e preste mais atenção às oportunidades que o nosso próprio continente oferece. “Há uma estatística - destacou - que me emociona: 86% das exportações da região vão para China, União Europeia e Estados Unidos, enquanto apenas 14% ficam no continente”.
Nesse sentido, Abraham defendeu que o regional e o multilateral devem ser vistos como complementares: “Devemos fortalecer os processos regionais, mas também continuar trabalhando nos processos bilaterais e multilaterais”.
Consultado por Otero sobre os temas centrais da agenda agrícola regional, a embaixadora falou sobre o enorme desafio que a adaptação às mudanças climáticas representa.
“Embora seja verdade - destacou - que a agricultura e a produção de alimentos contribuem para a soma dos gases de efeito estufa, também é verdade que existem experiências muito valiosas na América Latina e no Caribe de práticas que mitigam a quantidade de dióxido de carbono. Nossos países estão se adaptando às demandas e a agricultura continua sendo uma das atividades econômicas com maior potencial, não só para a geração de riquezas, mas também para garantir a segurança alimentar e trabalhar para reduzir a pobreza”, finalizou a ex-primeira Ministra da Costa Rica.
Fonte: IICA
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