País sofre pressão da indústria para contratar novas usinas eólicas e solares, mas tem sobre capacidade de geração.
Autoridades brasileiras têm enfrentado a difícil tarefa de dizer "não" a investidores globais ávidos por colocar bilhões de dólares em projetos de energia renovável no país mesmo em meio a uma enorme recessão.
Principal mercado para renováveis na América Latina e um dos maiores do
mundo, o Brasil sofre pressão da indústria de energia para contratar
novas usinas eólicas e solares, o que não acontece desde 2015.
Mas uma sobrecapacidade de geração e custos adicionais para tarifa
decorrentes de eventuais novas contratações de usinas geradoras exigem
cautela, dizem especialistas do setor elétrico e autoridades.
O governo pretende primeiro "arrumar a casa" antes de retomar as
contratações, o que tem passado pela criação de novas regulamentações
que permitem cancelar projetos problemáticos que não saíram do papel nos
últimos anos e por estudos para uma revisão da regulamentação do setor.
"Por mais que a gente seja tentado, não podemos escolher um segmento e
dizer que ele está isolado da crise do país e que lhe daremos o que
ninguém tem, uma demanda garantida... por mais que seja justificável,
meu papel tem sido, no âmbito técnico, dizer não", disse o
secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Paulo Pedrosa.
Ao participar de evento do setor nesta semana, Pedrosa admitiu que há
pressões de todo o tipo pela retomada das licitações, "inclusive
políticas".
Ele disse que o governo pretende retomar os leilões, mas ainda não é possível garantir quando.
O Brasil contratou um recorde de novas usinas no período entre 2009 e
2015, mas a enorme recessão econômica levou a demanda por eletricidade a
cair em 2015 e 2016, o que não acontecia no país desde 2009.
Ao mesmo tempo, diversas usinas contratadas nesse período não
conseguiram sair do papel devido à degradada situação financeira de
alguns investidores, à falta de crédito com a crise e outras questões,
como problemas com fornecedores.
Agora, o governo tem apostado na inédita solução de descontratar usinas para verificar se há mesmo necessidade de novos empreendimentos mesmo em meio à baixa demanda.
Diversos parques eólicos já rescindiram contratos, e em agosto o
governo deve realizar novas descontratações, por meio de um leilão
específico para cancelar projetos.
"Acho que logo após isso a gente deve ter um panorama bem definido...
após tudo isso, ouvindo o mercado, ouvindo as distribuidoras, aí sim
vamos tomar uma decisão", disse o ministro de Minas e Energia, Fernando
Coelho Filho ao ser questionado sobre o tema em um evento nesta semana.
O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr., fez coro às falas do
governo ao participar de encontro com investidores em energia solar.
"Tem que ser sustentável... a primeira coisa é a gente resistir a
algumas tentações, algumas facilidades", afirmou ele, ressaltando que é
preciso ter clareza sobre a demanda por energia antes de realizar novos
leilões.
Indústria preocupada
A pressão a favor dos leilões tem sido movida por representantes de
investidores que querem construir usinas e fabricantes de equipamentos,
que temem ficar com fábricas vazias devido à ausência de novos projetos.
No boom renovável dos últimos anos, o Brasil atraiu produtores de
turbinas eólicas como a dinamarquesa Vestas, a norte-americana GE e a
espanhola Gamesa, além de fornecedores solares como a chinesa BYD e
aCanadian Solar.
O crescimento das renováveis também gerou renda em cidades pobres do
Sul e do Nordeste, o que tem feito políticos locais se somarem à pressão
sobre as autoridades de energia do governo federal. Em janeiro,
governadores do Nordeste foram a Brasília pedir mais leilões de usinas
eólicas e solares.
Mas o diretor da consultoria Excelência Energética, Erik Rego, acredita
que apenas a soma dessas pressões explicaria a retomada dos leilões com
força já em 2017.
Por parte dos investidores, o interesse em renováveis tem crescido e a
demanda não seria um empecilho, uma vez que os contratos oferecidos nos
leilões de energia do governo são de longo prazo e garantem receita
estável para as usinas independentemente do nível de consumo de
eletricidade no país.
Impacto tarifário
Uma das formas de contratar novas usinas no Brasil é em leilões
promovidos pelo governo para as distribuidoras de energia, após estas
preverem a demanda de seus clientes no futuro.
Mas a decisão sobre leilões de energia também pode vir do governo, caso
das usinas "de reserva", que não dependem da demanda das distribuidoras
porque são contratadas para elevar a segurança do sistema.
A Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace),
que representa pesos pesados como Dow, Alcoa e outros, teme que uma
contratação via leilão de reserva mesmo sem demanda represente mais
custos em um momento já difícil para a indústria e consumidores.
"Ainda existe sobreoferta... esse problema (de segurança do sistema)
não existe hoje, por isso acho que um leilão aumentaria os custos para o
consumidor desnecessariamente. Essa é a preocupação", disse à Reuters o
presidente da Abrace, Edvaldo Santana, lembrando que os consumidores
estiveram bastante pressionados nos últimos anos.
As tarifas de eletricidade do Brasil subiram em média 61 por cento
entre 2013 e 2017, segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel), ante alta de cerca de 28 por cento na inflação, de acordo com
dados do Banco Central.
Fonte: G1
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